CASA DA CULTURA GÓES ARTIGAS: Somos Sementes


Taisa Lewitzki é antropóloga, pesquisadora e sócia-fundadora da Casa da Cultura Góes Artigas. Bacharel em Antropologia - Diversidade Cultural Latino-Americana pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana (2015) e Mestra em Antropologia pela Universidade Federal do Paraná (2019), atualmente é doutoranda em Antropologia Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2019). Integra o Grupo de Pesquisa Etnologia, Tradição, Ambiente e Pesca Artesanal (ETAPA/UFRN); o Núcleo de Pesquisa do Projeto Nova Cartografia Social do RN (PNCS/UFRN) e a Equipe Editorial da Revista Equatorial (PPGA/UFRN). Tem experiência na área de Antropologia dos Povos e Comunidades Tradicionais, atuando principalmente na pesquisa com movimentos sociais de povos e comunidades tradicionais de benzedeiras e faxinais no Estado do Paraná e povos indígenas no Estado do Rio Grande do Norte. Pertence a comunidade rural de Góes Artigas, situada no município de Inácio Martins, onde é autora do Projeto Casa da Cultura Góes Artigas, certificado como Ponto de Cultura pela Secretaria da Diversidade Cultural. 
Por: Taisa Lewitzki - Casa da Cultura de Góes Artigas

A primeira coluna da Casa da Cultura Góes Artigas, reflexiona sobre a afirmação que intitula esse texto. O que significa ser semente no contexto das mulheres rurais de Góes Artigas?

Para abordar a associação entre sementes e culturas é preciso olhar a estreita relação entre as mulheres e os conhecimentos. Ao ingressar no mundo rural em que o município de Inácio Martins faz parte, é fácil observar no alto das serras e no centro da cidade as roças, cultivos, quintais, jardins e pomares que desenham as moradas martinenses. Mais fácil ainda, é entrar em uma conversa sobre plantios e colheitas, e sair com sementes e mudas nas mãos.

Em diferentes lugares do mundo são as mulheres responsáveis pela manutenção da sociobiodiversidade dos ecossistemas. São elas que detêm e mantêm as práticas e saberes acumulados pelas gerações ao que correspondem às formas de dar vida a pessoas, plantas e animais. A palavra cultura também advém do verbo cultivar em sua etimologia mais naturalista, se formos pensar dessa forma, cultura é cultivar e as mulheres cultivam vida.

A partir dessa perspectiva, a Casa da Cultura Góes Artigas é uma forma que nós mulheres caboclas encontramos para cultivar conhecimentos, através do encontro e partilha de experiências. Somos sementes em sua diversidade, cada uma com sua trajetória de vida - agricultoras, professoras, estudantes, donas de casa, empreendedoras, artesãs, comerciantes, lideranças comunitárias, religiosas e políticas. Acionamos conhecimentos de forma coletiva para que todas possam florir, cada uma em sua estação.

Organizadas como coletivo de cultura, empreendimento de economia solidária feminista e associação de produtoras rurais, ampliamos nossas potências, por meio do resgate de saberes e defesa de valores, e dessa forma multiplicamos boas práticas, voltadas ao bem comum.

Parece utópico? Pois é, somos sonhadoras. Sonhamos com dias melhores para nós, para nossas famílias, para nossa comunidade e para toda a sociedade. Também sonhamos com uma biblioteca, um cinema, uma cozinha, um ponto de encontro, enfim, um lugar para cultivar juntas.

A  Casa da Cultura é a efetivação desses sonhos-sementes que brotaram  no ano de 2016 na comunidade rural de Góes Artigas. Tomamos a iniciativa de colocar a mão na terra, preparar o solo, classificar as sementes, esperar a lua certa para semear. Para isso, trocamos sementes com mulheres de outras regiões, pertencentes a grupos e organizações do campo e da cidade. Articulamos práticas tradicionais com os conhecimentos das mais jovens, usamos nossos próprios recursos para produzir adubações, regamos com a água da chuva, protegemos do frio do inverno, observamos com cuidado. Algumas sementes brotaram, cresceram e estão proporcionando frutos de um ciclo de quatro anos. Outras sementes estão em dormência e podem despertar a qualquer momento, nos surpreendendo com sua beleza. Mas nunca deixamos de semear, porque acreditamos que dias mulheres virão.

Imagem: Olinda Lewitzki Drutchiaki


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